domingo, 2 de dezembro de 2012

Resiliência

Não me assustou a superioridade das batas brancas, o cheiro insuportável a esterilizado ou a dor.

Amedrontou-me a imprevisibilidade do desfecho, a impotência contra os desvarios de uma máquina/corpo/invólucro que me apetecia rejeitar e a vida a pairar, interrompida, presa num sinal amarelo  intermitente sem fim.

Doeu-me ser diferente, olhar a vida dos outros e nela não poder encaixar a minha, encarar o futuro minuto a minuto, dia a dia, e querer sorver tudo de um só trago.

Resisti. Aos 3 cancros,  aos dias e noites de desalento, à sensação de amputação (de uma parte de mim, de uma parte da vida) e e à permanente e cortante lucidez.

Procurei brechas de normalidade, frestas de luz em dias cinzentos, sentidos e momentos de felicidade.

Neste caminho de cerca de 12 anos desejei morrer, quis fugir e procurei esconder-me dentro de mim sempre que consegui.

Vi muito: meninos presos a máquinas quando deviam estar a brincar numa qualquer escola, pais sem esperança, famílias em suspenso, avós com peles curtidas pelo sol e vidas de dureza extrema a lutar por mais alguns dias.

Resisti. Tive sorte. 

E senti que os outros valem a pena, os laços nos fazem maiores e melhores, a maior luta é aquela que escolhemos travar e o amor é o maior milagre da vida.